sexta-feira, 9 de maio de 2008

A NOVA ABOLIÇÃO - Petrônio Domingues

Uma obra que aborda a resistência dos afrodescendentes em organizações específicas depois da abolição da escravatura e resgata sua luta pela conquista da cidadania – da formação da imprensa negra às atuais ações afirmativas.

O livro A nova Abolição, do professor Petrônio Domingues, lançamento da Selo Negro Edições, coloca o negro em seu devido lugar: o de cidadão ativo, com papel importante na história do Brasil. Com apurado rigor científico, o autor trata nessa obra de temas essenciais à formação do país. Sua perspectiva, porém, é pouco usual: todos os fatos são analisados à luz da participação da população negra, de suas contribuições e especificidades.

Por meio dessa abordagem diferenciada, Domingues traz novos ares à história do Brasil, favorecendo principalmente os estudos que buscam contextualizar o negro no panorama histórico brasileiro. Sua análise acurada atinge períodos e situações distintos: desde a formação da imprensa negra e sua repercussão no jornalismo brasileiro, no período pós-Abolição, até a atual questão das ações afirmativas (incluindo aí as cotas universitárias), passando pelo importante protagonismo negro na Revolução de 1932.

A participação do negro em diversos momentos históricos do Brasil tem no livro uma apresentação objetiva, que resgata muitas de suas particularidades esquecidas. Por meio de documentos de época, como os primeiros jornais da chamada imprensa negra, Domingues faz uma retrospectiva profunda, que concede ao negro a posição de protagonista que lhe é devida na historiografia brasileira.

Para reconstruir os passos da população negra brasileira, o autor analisa algumas de suas entidades de representação. A trajetória da Frente Negra Brasileira (FNB) e sua batalha anti-racista são exploradas em detalhe, assim como a subseqüente formação da Legião Negra (cujos soldados eram popularmente conhecidos como os Pérolas Negras), que se uniu ao exército constitucionalista e teve importante papel na Revolução de 1932.

Também o Teatro Experimental do Negro (TEN) e seu caráter vanguardista são contemplados na análise do autor, que destaca a importância da manifestação artística na sensibilização da opinião pública para a questão racial.

Além de realizar uma investigação detalhada do passado, Domingues traz à tona uma discussão do presente: as ações afirmativas. Dono de um posicionamento transparente, ele defende a política de cotas universitárias e embasa a discussão com argumentos dotados de conteúdo histórico e científico.

O autor
Petrônio Domingues nasceu em Recife (PE) e tem graduação, mestrado e doutorado em História pela Universidade de São Paulo (USP). Atualmente, é professor do departamento de História da Universidade Federal de Sergipe (UFS). É autor de diversos artigos em revistas acadêmicas e do livro Uma história não contada: negro, racismo e branqueamento em São Paulo no pós-abolição (Editora Senac, 2004).

ARTES DO CORPO

Este livro analisa a presença e a contribuição dos afrodescendentes no campo das artes e das manifestações lúdicas e populares. Por meio da história de vida de figuras exemplares, busca-se enaltecer a experiência de largas parcelas de nossa população que, mesmo diante das condições sociais mais adversas, lograram produzir um rico legado cultural nas áreas da dança, música, literatura, artes plásticas, esportes, festas e cortejos populares. 
 

 Ao atentarmos para a historiografia brasileira, percebe-se que a despeito dos afro-brasileiros terem contribuído de maneira significativa para a constituição daquilo que conceberíamos como "cultura" ou "identidade nacional", há pouquíssima produção que trate de evidenciar os negros como produtores culturais do ponto de vista individual. O esforço em revelar algumas dessas personalidades teve seus primeiros passos com os próprios negros por meio de seus veículos de informação: os jornais e as revistas do que se convencionou chamar de imprensa negra (Bastide, 1983).
 

É dentro dessa lacuna que o lançamento da coletânea Artes do corpo (2004) se enquadra. Trata-se do segundo volume da coleção intitulada "Memória afro-brasileira", a qual vem sendo organizada pelo antropólogo e professor da Universidade de São Paulo Vagner Gonçalves da Silva e editada pelo Selo Negro Edições. Enquanto o primeiro número, Caminhos da alma (2002), voltava-se para o universo da religião e de como esta no decorrer do tempo vem organizando laços identitários e de solidariedade entre a população negra; o volume aqui apresentado foca o universo do corpo negro e do uso deste na produção cultural de artistas afro-brasileiros.
 

 Nesse sentido, é interessante voltar-se para a corporalidade negra, um dos motes que dão coesão aos nove artigos presentes na coletânea, pois, de acordo com o organizador no prefácio do livro, o corpo negro só tem sentido se pensado na confluência entre planos que geralmente são vistos e analisados separadamente. Entender o mundo afro-brasileiro é não fazer distinção entre sagrado e profano, arte e cotidiano, mito e rito, ou corpo e alma, algo que tem impacto direto na produção artística de pessoas inseridas neste universo. Porém, esse é apenas um dos elementos que dão unidade ao livro, há vários outros como o uso da biografia como ferramenta de análise. Esta apresenta resultados bastante satisfatórios, tornando a leitura agradável tanto para o público acadêmico especializado como para o leitor leigo.*


*Textro extraído do Site da Revista de Anropologia da Usp e escrito por Márcio Macedo, mestrando em Sociologia.


Silva, Vagner Gonçalves da (org.), Artes do corpo , São Paulo, Selo Negro Edições, 2004, 252 pp.

terça-feira, 6 de maio de 2008

Falares Africanos na Bahia - Yêda Pessoa de Castro

Aurélio Buarque de Holanda e Houaiss estão em xeque. Pelo menos é o que atestam os estudos da conceituada etnolingüista baiana Yeda Pessoa de Castro, que lançou o livro Falares africanos na Bahia, que tem fomentado polêmicas por onde passa. Em linhas gerais, o escrito lança a inusitada idéia de que o português falado no Brasil está muito mais para o banto-africano do que para o luso-europeu e indígena. A tese seria uma espécie de desafio aos ditames acadêmicos dos conhecimentos etimológicos do português falado por aqui, que supervaloriza a influência da fala indígena e dá mérito ao português de Portugal, dispensando, muitas vezes, a influência da articulação dos falares dos povos africanos que para aqui foram trazidos entre os séculos XVI e XIX.

'O que me estarreceu é que como se explicava o fato de não haver nenhuma influência africana no nosso português, sendo que o Brasil recebeu de seis a oito milhões de falantes, um número muito superior à da população branca?', colocou, enfatizando que muito cedo os índios se retiraram das cidades para as matas, sendo que as suas influências na língua se concentraram mais em área rurais. A etnolingüista, 65 anos, levou 40 anos de estudos na Bahia, Congo, Nigéria e Trindad e Tobago para chegar até a sua tese. Não sem motivo, o escritor Millôr Fernandes tem propagado que Falares africanos na Bahia é sua nova Bíblia.

'No encontro das línguas africanas, o banto em particular, como o português arcaico, em vez de emergir uma nova língua, aconteceu um processo de africanização em função da semelhança estrutural entre o banto e o português arcaico. As línguas banto têm sete vogais orais, do ponto de vista da pronúncia, assim como ocorre no português do Brasil e no português arcaico', disse Yeda, referindo-se à estrutura extremamente vocalizada dessa língua onde cada sílaba vem acompanhada de uma vogal. 'Mesmo as sílabas átonas são pronunciadas no Brasil como nas línguas banto' atestou.

Os negros que foram trazidos para o Brasil durante três séculos são, em grande maioria, de origem banto. Por isso mesmo, a predominância das palavras africanizadas do português daqui vem dessa nascente. Diferente, portanto, do teor de influências dos falantes de ioruba (nagô), procedentes da Nigéria Ocidental e Benin Oriental (reino ketu), que foram trazidos já no terceiro ciclo da escravidão. Entretanto, a maioria dos estudos sobre o tema concentra-se na influência iorubá.

segunda-feira, 5 de maio de 2008

Enciclopédia Brasileira da Diáspora Negra



Enciclopédia Brasileira da Diáspora Africana

Autor - Nei Lopes

Com nove mil verbetes, a obra, assinada por Nei Lopes , compositor e escritor, integrante do mundo do samba e militante da causa negra, é um trabalho inédito e pioneiro. Ela reúne, em um único volume, uma gigantesca massa de informações ligadas à saga dos afro-descendentes nas Américas e em outras partes do mundo. Com isso, além de elevar a auto-estima da população negra, a obra aparece como referência fundamental entre os modernos estudos sobre o continuum africano na diáspora.

Sambista de sucesso, militante da causa afro-descendente e intelectual com senso prático, Nei Lopes há muito tempo percebeu a carência de uma
bibliografia popular brasileira sobre assuntos africanos. Sem vinculação acadêmica, mas autor de 14 livros publicados (mais 2 já no prelo), há cerca de 10 anos ele decidiu produzir uma obra de cunho enciclopédico que reunisse, em um único volume e em forma de dicionário, informações multidisciplinares sobre o universo das culturas africanas, afro-americanas
e afro-brasileiras. O resultado dessa inquietação e de longos anos de trabalho é a “Enciclopédia Brasileira da Diáspora Africana”, lançada pela Selo Negro Edições. São nove mil verbetes, abordando assuntos dos mais
diversos a partir do ponto de vista brasileiro — de biografias a vestuário; de fatos históricos e contemporâneos a acidentes geográficos, flora e fauna; de festas e divertimentos a profissões e atividades.

Inédita e pioneira pelo conteúdo e pela metodologia de pesquisa, de forte compromisso com o registro fiel e exato das informações coletadas, a obra tem a alma de Nei Lopes. Sempre criativo em suas realizações, ele vem enriquecendo o panorama da cultura nacional com a sua singular capacidade de elaborar e interpretar a dimensão mais densa e profunda da africanidade no
país.

Um dos grandes objetivos da Enciclopédia Brasileira da Diáspora Africana, segundo o autor, é popularizar conhecimentos antes restritos a especialistas, num momento em que ocorrem no Brasil reformas de currículos escolares, em uma perspectiva mais afrocentrada. Nesse sentido, a obra vai muito além dos estereótipos freqüentemente associados ao negro brasileiro — cuja participação na formação da cultura nacional é recorrentemente restrita às áreas do folclore, da música, da dança e da culinária. De acordo com Elisa Larkin Nascimento, pesquisadora e co-fundadora do Instituto de Pesquisas e Estudos Afro-Brasileiros, “a Enciclopédia é um compêndio de
informações complexas, aprofundadas e não divorciadas de seu contexto mais amplo, a matriz cultural do mundo africano”.

Outro alvo importante é a auto-estima do negro. Para o autor, a Enciclopédia Brasileira da Diáspora Africana sinaliza um passo decisivo na reflexão para
construção de uma auto-estima positiva na emocionalidade do leitor afro-brasileiro. “São referências onde o leitor negro se localiza e se
estrutura para construir a tão buscada e quase nunca atingida auto-estima”, diz. Nei Lopes lembra que nas publicações disponíveis, o negro parece só ter
interesse etnográfico. “Nessas obras, raramente figuram heróis, sábios, grandes homens. Para essas publicações, em geral, o vocábulo ‘negro’ define,
no Brasil, mais uma categoria social, já que os ‘grandes homens’, quando afro-descendentes, são apenas ‘nascidos em lar humilde’ e quase nunca
efetivamente ‘negros’”.

A paixão e o engajamento nas questões da negritude, independentemente de vínculos acadêmicos, fez com que Nei Lopes, estudioso e pesquisador nato,
mergulhasse em um minucioso e rigoroso processo de pesquisa para produzir verbetes curtos e resumidos. A ótica desenvolvida dedica bastante ênfase às
biografias de anônimos que fizeram ou fazem parte da história africana, como revolucionários, líderes religiosos e educadores. No que diz respeito à
religião de origem africana, o autor procura fechar um círculo de informações no tripé Brasil-Cuba-África.

Entre os diversos verbetes, o leitor saberá, por exemplo, quem foi Diane Abbot (1953). Parlamentar inglesa em Londres, filha de pais jamaicanos, ela
tornou-se a primeira mulher negra eleita como membro do Parlamento Britânico em 1987. Destacou-se na defesa anti-racista dos imigrantes pobres e das
minorias étnicas. No campo da religião, Nei procura, por exemplo, desconstruir a satanização do vodu haitiano, mostrando-o apenas como uma
religião sincrética, de forte participação na História daquele importante país — matriz, no século XIX, a libertação negra nas Américas.

Resumindo, como diz Emanoel Araújo, artista plástico e organizador do livro“A Mão Afro-brasileira”, um dos apresentadores da obra: Nei Lopes, com
talento sensível e legítimo, “tem na alma o sentido do tempo, a busca da permanência, a continuidade da vida como ela é.

No ar, espaço para leitura negra

Acabamos de lançar mais um espaço pioneiro na cultura afro-brasileira.
Trata-se do blog leitura negra, totalmente destinado a livros e autores negros.
Um espaço para valorizar o autor e as obras tão pouco difundidas de nossa cultura.
Seja bem vindo, aprecie, leia e torne-se um visitante assíduo de nosso espaço.

Este blog é dos mesmos idealizadores dos sites Casting Black e África na Escola